Completo. Lê-se de cima para baixo

3º dia

Só hoje tomei banho, mas também dei banho a toda a casa de banho. Aquele sistema poliban é infernal: água por todos os lados, ora muito quente, ora fria.
Saí ás 8 e apanhei logo boleia, mas noutra direcção: Almodôvar. Ironicamente, o casal que ontem me trouxe para Beja ia exactamente para… Almodôvar. Hoje, eram duas moças, p’raí estudantes do ma­gistério e um tipo que conduzia mal.
Estive 3 horas em Almodôvar e nada de boleias. Só passou um enterro.
Com este calor incrível, os fritos, que a mamã metera na merenda, estragaram-se, claro.
Almocei um quilo de tomates com sardinhitas assadas, muito boas, na tasca da Sr.ª Rosa, uma muito velhota, castiça e atarefada taberneira, que servia copos de vinho e sardinhas para uma dúzia de velhotes, que parece gostarem do sítio, que aliás é agradável. Também vende aveia, vassouras, bilhas, etc.
Estou a pensar arrancar a pé, pedindo boleia. Estou farto de estar parado. Dizem-me que, ficando na bomba de gasolina, se arranja boleia com mais facilidade, mas eu não gosto do sistema: cai-se mais facilmente na subserviência e eles, se dão boleia, é porque são apanha­dos de peito descoberto. Dão-na, mas contrafeitos. Assim, na estrada, só dá quem quer e mantenho a dignidade.
Aliás, é giro ver as reacções deles. Os que vão cheios fazem o gesto de que vão cheios. É o pretexto perfeito pa­ra se safarem. Dos outros, a maior parte indica que vai só ali à frente, (como se eu acreditasse) e os outros nada dizem, mas sentem-se incomodados por eu os obrigar a tomar posição e aceleram. Enfim…

Pus-me a pé, realmente. Andei 6 km e ninguém parava. Acredito que haja tipos que se sintam desesperados, quando ninguém liga à sua situação difícil (mendigos, reformados, etc.).
Finalmente, um tipo levou-me até uma territa, com um nome estranho: Dogueno.
Aí, um camionista, que parara para beber um copo, chamou-me e levou-me até Fa­ro por aquela estrada difícil, cheia de curvas.
Em Faro vi o meu colega de trabalho, Antonino.
Uma mulata, cheia de sorrisos meigos, levou-me até Olhão.
Daí, uma furgoneta le­vou-me mais a outro português e a um casalito inglês e deixou-nos logo à frente.
Um senhor católico levou-me até Tavira. Tenho a certeza de que me deu boleia por vir a ouvir uma palestra católica na rádio.
Voltei a ver os ingleses que foram com um tipo que não parou para mim, mas fez uma gran­de travagem para eles.
O mesmo da furgoneta le­vou-me mais 5 km.
Um casal alemão levou-me até a 6 km de Vila Real, onde estava um casal português, assim já para o desesperado, pois já era noite mesmo.
Um senhor dos Serviços Florestais levou-me até Monte Gordo.
Ansioso por me sentir junto à fronteira e saber que de manhã entro em espaço verdadeiramente novo, peguei na trouxa e to­ca de calcorrear os 3 km que faltavam para Vila Real de Santo António, apesar de já ter uma bolha num pé.
Apenas cheguei, logo um ti­po se ofereceu para me indicar um quarto, onde me acompanhou. Preço: 70 “paus”. Dormi bem!

1 Comments:

At 28/6/05 10:25, Anonymous Anónimo said...

Vou transcrever este capítulo das tuas deambulações. É que chegaste à munha terra e não posso deixar passar isso em branco. Abraço e boa viagem.

 

Enviar um comentário

<< Home

Mais recente›  ‹Mais antiga